Por que não voto mais em Serra

  
   Por Felipe Andrade

    Há alguns dias venho pensando em expor meus pensamentos sobre a reta final das eleições presidenciais de 2010. O marasmo e a decepção tomaram conta da minha vontade política e tiraram meu interesse em acompanhar de perto a campanha eleitoral.

     No 1º turno, já sem tanta convicção, votei em José Serra para presidente do Brasil. Confesso que foi mais por que, naquela ocasião, ainda não tinha tanta confiança em Marina Silva. Se o 1º turno fosse hoje, com certeza votaria nela.

     Pois bem. Durante a campanha do 2º turno das eleições, Dilma Rousseff só me fez confirmar a opinião que tinha sobre ela. Foi uma figura inventada por Lula. Ainda é fácil de ser manipulada mas, apesar disso, me parece uma pessoa confiável, que não tem, e não terá, envolvimento com corrupção e afins. Confesso que minha simpatia por ela aumenta um pouco a cada dia. Desejo um bom governo a ela.

    Minha grande decepção nestas eleições foi José Serra. Não só pelo candidato, mas por ele fazer parte do partido que eu tenho mais afinidade, o PSDB.

    Enumero abaixo os motivos relacionados a alguns temas, pelos quais retiro meu humilde voto, que naturalmente seria dele neste 2º turno:

Religião

    Ele nunca foi religioso. Inseriu o tema "Deus" na campanha por puro interesse, para tentar conseguir votos de fiéis por todo o país, que estavam desacreditados com os boatos que circulavam sobre sua adversária. Colocou Silas Malafaia em sua propaganda, o que para mim foi um grande erro. Sua campanha se aliou a ala mais radical da CNBB, para lançar sobre o eleitor a dúvida esdrúxula sobre o caráter e a honestidade de Dilma. O momento que o Brasil vive, de diversidade de ambos os gêneros, não suporta mais radicalismo, mesmo que ele seja religioso.

Aborto

    José Serra abordou o aborto de forma inconsequente. Não quero entrar no mérito sobre sua esposa, Mônica. Se ela fez ou não aborto, é um problema totalmente particular do casal Serra. O que não vale é usar da hipocrisia, atacando algo que você já fez e nunca revelou. Mais uma vez, o candidato tentou lançar sobre sua adversária a fama de "abortiva", "que não defende a vida". Só que Serra deve ter esquecido que milhares de mulheres, inclusive jovens e crianças, sofrem com gravidez muitas vezes causadas por estupro, por prostituição infantil e coisas deste tipo. O aborto não deve ser tratado como questão religiosa. Isso é tema de saúde pública, como já foi dito pelas poucas pessoas conscientes durante a campanha.

Homossexualismo

    Não vou entrar no tema da legalidade ou não do casamento civil. Humildemente, creio que essa discussão trascende o fato de ser legal ou ilegal a união. Penso que o tema principal a ser tratado é o respeito para com o ser humano. Como disse acima, o Brasil não deve mais dar espaço para radicalismos. Pessoas homossexuais não deixam de ser seres humanos como qualquer outro, por conta de sua opção sexual. Creio que homofobia deve sim ser considerado crime, do mesmo jeito que é crime praticar atos de preconceito contra negros, indígenas e por aí vai. Se o respeito vem através da legalização da união, que seja feita. E José Serra usou isto para tentar se promover.

MST

    Talvez seja o único ponto em que concordo em partes com Serra. Atualmente, o MST não é um movimento social. É um agrupamento de pessoas que tem como primeira intenção destruir o que é do próximo. Porém, muitas pessoas de bem acabam levando a fama de baderneiros, por conta de uma parcela pequena de bandidos infiltrados neste e em outros movimentos sociais. E Serra não leva este fato em conta. Isso só se resolve com a tão sonhada Reforma Agrária, que nem ele, nem Dilma conseguirão tirar do papel, infelizmente.

Defesa do Governo FHC

    Foi, sem dúvida, o primeiro ponto em que comecei a mudar meu pensamento em relação ao meu voto. Se Dilma Rousseff é produto de Lula, e a ele deve sua eleição, o mesmo ocorre, em menor escala, claro, com José Serra e Fernando Henrique Cardoso. Até o governo FHC, Serra era mais um político entre tantos outros. Só após ser colocado no ministério da Saúde, que o candidato começou a mostrar seu trabalho. Tanto que grande parte de sua propaganda política não faz referências ao que ele fez como prefeito ou como governador, mas sim como Ministro. E esta oportunidade foi dada por FHC. E Serra não soube, ou não quis defender Fernando Henrique. Talvez isto seja um tabu dentro do partido, não sei. Mas deve ser quebrado. Grande parte do PSDB e Serra devem perceber e aprender, de uma vez por todas, que FHC não pode ficar escondido. Sem as coisas que FHC fez na economia, não haveria prosperidade no Governo Lula. Qualquer economista meia-boca pode provar isso.

Privatizações

    Não sou a favor de privatizar todos os bens do país. Mas também sou contra deixar tudo na mão do Estado. O governo FHC privatizou áreas que deveriam sim, ter sido privatizadas. Hoje a Vale emprega quase 60 mil pessoas no país, contra apenas 13 mil quando ainda era estatal. Ela dá de lucro ao Brasil por ano, que ela não havia dado desde sua fundação até o dia de sua privatização.
    O setor de telefonia foi privatizado também. Que ótimo. Quantas pessoas conseguiram o primeiro emprego e se desenvolveram na vida através do trabalho nas empresas de telefonia. Hoje o brasileiro tem acesso a internet e celulares. E isto só foi possível por conta da privatização da Telebrás.
    Porém, ao invés de mostrar os benefícios das privatizações, Serra prefere se esconder delas e mudar o discurso, atacando as concessões feitas pelo governo Lula sobre o petróleo da Petrobrás. País sem capital externo, sem capital privado, tem forte possibilidade de virar uma Cuba ou uma Venezuela. E o Brasil é muito maior que isso.

Conjuntura política

    Sem ter a intenção de fazer um mea-culpa sobre meu voto em primeiro turno, até por que não sabia sobre os resultados das urnas. Mas, talvez, para o momento em que o Brasil vive e para os resultados do 1º turno, seja melhor que Dilma Rousseff vença. Explico por que:

    A maioria dos eleitos para a Câmara dos Deputados e para o Senado faz parte da base aliada que Lula montou em torno de Dilma, para que ela tenha sustentação em seus projetos. Tudo bem que boa parcela disso se refere ao PMDB, que é dos partidos mais "mureteiros" do país. Vai para quem está no poder. Porém, se Serra for eleito, os políticos que atualmente são situação, virariam oposição, e poderiam complicar muito a vida de Serra como presidente, prejudicando assim o crescimento do país. E nós sabemos como político é "bicho ruim".

Casos de corrupção

    Grande parte da minha aversão ao presidente Lula ainda é pelo fato do Mensalão, em 2005. Tenho convicção de que ele não estava envolvido naquela roubalheira. Mas ele passou a mão na cabeça de pessoas corruptas, como José Dirceu, José Genoíno e outros bandidos. E, pessoal e humildemente, eu ainda não engoli isso. Tenho total repúdio a corrupção, a quem rouba e a quem protege ladrões.
    Nos últimos dias, a campanha de Serra foi assolada por dois escândalos de corrupção. Um deles envolvendo Paulo Preto. Tudo bem que os 4 milhões de reais que sumiram eram destinados para propagandas de Serra. Mas isso também é roubo. E Paulo Preto foi acobertado.
    A gota d'água foi ontem, quando li uma denúncia de esquema no metrô de São Paulo, obra que Serra se vangloria de ter dado um "up". Se há abertura de licitação, é por que deve haver concorrência. Se seis meses antes já se sabiam os vencedores desta licitação, como a Folha de São Paulo registrou em cartório que já sabia, existe aí um ato ilícito, que para mim também é difícil de engolir.

    Enfim.

    Nenhum dos dois candidatos, Serra ou Dilma, tem a categoria de FHC e Lula. Para mim, estes dois presidentes se completam. Poucos países no mundo tiveram a oportunidade de ter um FHC e um Lula como presidentes seguintes, para dar uma alavancada no crescimento da nação. O Brasil não foi descoberto em 2003. Ele foi redescoberto com o governo de Itamar Franco, e foi sendo acreditado durante os governos FHC e Lula.

    Espero, sinceramente, que Dilma ou Serra, qualquer um que seja eleito, tenha somente um mandato de 4 anos. E que Lula ou FHC não voltem à cena política. Fiquem na história. Deixe 2014 com políticos jovens e com grande capacidade de fazer o Brasil avançar cada vez mais. Políticos como Aécio Neves (MG), Eduardo Campos (PE), Sérgio Cabral (RJ), Beto Richa (PR), ou o próprio Tião Viana (AC). Estes, com toda certeza, honrariam mais os legados de FHC e Lula, e fariam muito mais pelo Brasil.